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segunda-feira, janeiro 26, 2009

Entrevista

Em outubro de 2008 a artista plástica Gaby Benedyct me escolheu para realizar uma entrevista para o site Artistas Gaúchos, confira abaixo o resultado:

1. Partindo de suas experiências artísticas, em que ponto o design gráfico deixa de ser ilustração publicitária para tornar-se arte?
Como design gráfico para mim é resolver conceitualmente o problema gráfico de determinado cliente trabalhando com a relação entre a imagem e o texto, no momento que não se tem essa preocupação no trabalho visual eu acredito que se esteja fazendo arte.

2. Qual o conceito/processo de sua produção? Qual a relação de sua arte com o mundo em que você vive?
Não tenho um processo específico, mas normalmente é pela técnica do desenho, pela técnica do nanquim, criando a partir de imagens do cotidiano e da mídia ou simplesmente da minha imaginação, auxiliado por uma música que eu gosto. Com a tecnologia disponível hoje em dia é muito fácil ter acesso e captar uma variedades de imagens que são essenciais para estimular e desenvolver o meu processo criativo.

3. Como você vê os diálogos entre os artistas que fazem uma especialização em arte como uma UFPel ou UFRGS e os artistas urbanos, nascidos da produção espontânea como os grafiteiros que tomaram o Santander, por exemplo. Na sua opinião, existe um preconceito velado entre os dois grupos ou as coisas caminham para integração?
Tive a oportunidade de ver a exposição no Santander, e gostei bastante do resultado da "invasão", um espaço que normalmente é utilizado para exposições de artistas contemporâneos consagrados.
Não sei te dizer se no geral existe uma integração entre grafiteiros e artistas que tem uma formação acadêmica. Não me lembro de ver especificamente uma exposição com grafiteiros e artistas acadêmicos.
Acho que o caminho que estes dois tipos de artistas percorrem são distintos, mas com um objetivo que é praticamente o mesmo para ambos, o reconhecimento do seu trabalho pelo público das ruas ou das galerias de arte, além de se manterem com a venda das suas obras.
Eu particularmente como designer gráfico tento trocar informações com grafiteiros e artistas visuais que conheço pessoalmente ou pela internet, valorizo as duas formas de expressão.

4. Tendo participado de diversos eventos e grupos artísticos coletivos, o que você acha que funciona e o que não funciona? O trabalho ocorre realmente com espírito de grupo, ou cada um cuida de sua parte e o coletivo é só o nome? O que você acha que faz que aconteça o envolvimento como grupo?
Na realidade participo de apenas um grupo que é o C.D.M. ou Centro de Desintoxicação Midiática, realizamos intervenções urbanas gráficas pelo menos uma vez por semestre na cidade de Pelotas desde 2004, isso sem contar os eventos que nos convidam ou os eventos que nós enviamos projetos. Quando nos preparamos para uma intervenção realizamos várias reuniões onde todos participam e chegamos a um acordo de como ela deve ser realizada, mas na maioria das intervenções cada um desenvolve o seu próprio trabalho separadamente e na data marcada juntamos tudo e realizamos a ação urbana.
Uma coisa que não funciona com a gente é realizar uma intervenção assim que temos uma idéia interessante, demora um certo tempo até que possamos concretizá-la, infelizmente temos uma lista dessas idéias que não seguiram adiante, as nossas intervenções por causa disso são na maioria atemporais.
O que sempre deu certo foram os registros fotográficos que realizamos das nossas ações, desde a primeira intervenção disponibilizamos esse material em redes sociais e no nosso site, quem conhece o nosso grupo pela internet acaba tendo uma percepção que o nosso trabalho é profissional e de qualidade, mas nós sempre advertimos que o nosso trabalho é um embuste.
Nos conhecemos desde a época da faculdade, todos os integrantes do grupo frequentaram o mesmo curso, a mesma turma, e por incrível que pareça só começamos a desenvolver um projeto coletivo independente dos projetos da facudade depois de formados, o nosso entrosamento já existe há um bom tempo, já tem quase dez anos na verdade.

5. Dos eventos coletivos que você participou, qual o principal conceito que você diria que eles tem em comum e porque?
O primeiro evento coletivo que participei pelo C.D.M. foi o Reverberações que aconteceu na cidade de São Paulo em 2004 e o último foi o Percursos em Porto Alegre no ano de 2007.
O conceito principal que eles tem em comum é colocar diversos grupos artísticos em contato com o público, provocando e interagindo com as pessoas que circulam pela cidade ou no entorno do evento, instigando uma reação nos transeuntes ocasionais.
Deste modo é formado um espaço de troca de experiências entre os artistas/coletivos e a comunidade onde o evento está sendo realizado.

6. Como você vê a sustentabilidade da arte que não seja aplicada em publicidade (TV, revistas) ou na indústria (skate, moda, ...), como as artes exibidas em galerias de arte?
Não costumo expor em galerias de arte, não saberia te dizer ao certo como alguém se sustenta principalmente no interior do nosso estado expondo em galerias de arte, acredito que sejam poucos artistas que consigam isso.
Talvez esses artistas já tenham um público específico com um trabalho de fácil aceitação.
Pessoalmente eu não procuro este caminho, me sustento trabalhando como designer gráfico, o que me dá liberdade para que eu tenha uma produção artística que não seja comercial.

7. Qual sua opinião sobre as galerias de arte, das convencionais e da nova geração de alternativas? O que você acha que faria o público consumir o que todas elas oferecem, já que a suposição comum é que as vendas são mínimas? (Considerando que não importa o material que o artista use, nobre ou tosco, ou sua atitude, tudo tem custo e precisamos vender um pouco para pelo menos sustentar a arte).
O grupo C.D.M. já realizou duas exposições em lugares alternativos em Pelotas com o objetivo de divulgar os seus trabalhos e registros fotográficos e sem a pretensão de vendê-los, conseguimos pelo menos aumentar nossa rede de contatos.
Vejo com interesse o surgimento de galerias de arte voltadas para um público específico, como os espaços que divulgam a produção dos artistas de rua, desta forma fica mais fácil para o artista comercializar o seu trabalho com o público adequado, pena que só temos este tipo de galeria em cidades grandes.

8. Pensando na pobreza, na violência, na depredação profunda da natureza, na falta de educação entre as pessoas, no individualismo e todas as mazelas que avançam sobre a sociedade contemporânea, porque "ainda arte" para você? O que te move a achar que a arte é importante nesse contexto?

Esse cenário descrito sem a arte tornaria o mundo obscuro e complicado de se viver, portanto ter acesso a uma manifestação artística é muito importante, nem que seja para nos distrair algumas vezes disso tudo.
Mas algumas manifestações artísticas exploram e registram este mundo jogando na cara das pessoas que ignoram este contexto toda essa informação com o intuito de provocá-las, não podemos também nos alienar.